O ex-ajudante de ordens do governo Bolsonaro Mauro Cid articulou com contatos de dois estados para conseguir falsificar o registro de vacinação dele e da família. A informação aparece no relatório final da Polícia Federal sobre a investigação da inserção de dados falsos no sistema de SUS (Sistema Único de Saúde). Cid chegou a alegar, como mostra uma das conversas obtidas pelos investigadores, que teriam esquecido de colocar os dados da mulher dele no programa (veja prints das conversas abaixo).
Segundo o relatório, Cid procurou o sargento Luiz Marcos dos Reis para obter o documento já preenchido com as supostas doses aplicadas na mulher, Gabriela Santiago Cid.
A partir do pedido, o militar enviou um arquivo com o nome “cartão arquivo de vacinação” da Secretaria de Saúde de Goiás. O documento afirmava que Gabriela havia recebido as doses nos dias 17 de agosto e 9 de novembro de 2021.
Por meio da geolocalização do celular, a PF confirmou que a mulher de Cid estava em Brasília nas duas datas. O cartão foi assinado e carimbado pelo médico e sobrinho do militar, Farley Vinicius de Alencar.
Registros de conversas obtidas pela PF também mostram que o médico afirmou que copiou o lote das vacinas de um cartão de vacinação de uma enfermeira.
No segundo momento, Cid procurou o segundo-sargento do Exército Eduardo Crespo Alves para colocar os dados falsos no sistema do Ministério da Saúde. Em transcrições, Crespo afirma que a ação estava em andamento. A ideia era subir os dados pelo sistema do Rio de Janeiro.
No dia 24 de novembro de 2021, o militar manda outra mensagem para Cid afirmando que uma pessoa não identificada não estava conseguindo colocar os dados porque o lote da vacina não foi enviado para a região.
Cid diz que o suposto responsável esqueceu de cadastrar a suposta aplicação da vacina em sua esposa.
Com a dificuldade para colocar os dados, Cid e Marco dos Reis solicitam mais uma vez a ajuda do médico Farley Vinicius de Alencar.
A tentativa bem sucedida de realizar a fraude no sistema foi iniciada pelo ex-militar Ailton Barros. Em novembro, Barros pediu para Cid checar se um código havia sido enviado para o celular da esposa. Segundo a PF, a chave seria da conta gov.br de Gabriela.
Ailton repassou a numeração, e dados da operadora de celular mostram que a conta da mulher de Cid foi acessada pelo IP de Marcelo Fernandes de Holanda, localizado no Rio de Janeiro.
O relatório mostra diversas conversas entre o ex-militar e o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. Em uma delas, Ailton Barros afirma que acredita “que pelo menos uma delas [tentativas para inserir os dados] deverá dar bingo aqui do Rio”.
Dias depois, foi registrado no sistema que Gabriela teria recebido a primeira dose da vacina dia 25 de agosto de 2021 e a segunda em 15 de outubro de 2021.
Os dados só foram inseridos no sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações em novembro do mesmo ano.
As filhas de Cid e o próprio militar também constam no sistema como imunizados contra a Covid-19. A PF encontrou indícios de que a aplicação não teria acontecido, já que mensagens mostram que a rotina da família em Brasília permanecia normal.
A PF elenca uma conversa de Cid com o contato “Liliane Cid”, possivelmente sua cunhada, sobre possíveis exigências para viagens. O ex-ajudante de ordens da presidência chega a afirmar que não iria tomar as vacinas. “Eu não vou tomar, nem as crianças. As vacinas ainda estão em fase de teste. ‘Tô’ fora”, afirma.
Cid voltou a ser irônico com a fala de Bolsonaro relacionando a vacina com a possibilidade do paciente virar um jacaré. Uma delas, em um grupo que a PF acredita ser formado por familiares, o militar afirma que não vai ser cobaia humana.
R7