AO ESCOLHER CHAMBRIARD, LULA INSISTE EM RETOMAR AS POLÍTICAS FRACASSADAS DOS TEMPOS DE DILMA
Seria enganoso acreditar que a troca de comando na Petrobras tenha sido consequência apenas de intrigas palacianas ou divergências a respeito da distribuição de dividendos. Foi o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quem decidiu substituir o ex-presidente Jean Paul Prates por Magda Chambriard, ex-funcionária de carreira da petroleira e diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP) no governo Dilma Rousseff. O relevante e grave para o Brasil são as razões que motivaram a decisão. Ela é um sinal eloquente de intervenção do governo numa empresa aberta de capital misto, cuja motivação traduz o desejo de retomar as práticas dos tempos de Dilma, de tão traumáticas lembranças. Não há como evitar falar em retrocesso.
A reação dos agentes financeiros foi imediata. Nesta quarta-feira, a estatal perdeu R$ 34 bilhões em valor de mercado, puxando a Bolsa para baixo. Como revelou a colunista do GLOBO Malu Gaspar, Lula pretende que Chambriard acelere investimentos em refinarias, encomendas de navios e tente manter controle sobre o preço dos combustíveis, estratégias adotadas em governos anteriores do PT que já deram muito errado. A avaliação era que Prates não vinha dando a urgência desejada aos planos do governo. Na visão intervencionista de Lula, a petroleira deve ser um braço do Executivo para estimular empregos em setores tidos como estratégicos e para segurar a inflação via controle de preços — mesmo que tudo isso seja artificial, represente perdas bilionárias para a companhia e crie distorções na economia.
As evidências da volta ao passado estão até no vocabulário. Em conversa com Lula nos últimos dias, Chambriard prometeu acelerar projetos “estruturantes”, como a retomada de investimentos em refinarias como Abreu e Lima, em Pernambuco, e Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), rebatizado de Polo GasLub.
Abreu e Lima entrou para a História como um dos maiores focos de corrupção desmascarados pela Operação Lava-Jato e como um sorvedouro insaciável de recursos públicos (orçada em US$ 2 bilhões, consumiu US$ 22 bilhões e não foi completada). O Comperj, lançado no segundo governo Lula em 2008, deveria ter entrado em operação quatro anos depois. Também foco de desvios, acabou paralisado em 2015. Entre 2017 e 2018, o plano de construir uma refinaria foi adaptado para uma unidade de processamento de gás natural. Com a volta de Lula ao poder, a Petrobras retomou a ideia de investir no refino. Há duas semanas, lançou processo de licitação de obras para construção e finalização da infraestrutura. Sabe-se lá quando serão finalizadas e a que custo.
Nas administrações do PT entre 2003 e 2015, a Petrobras gastou US$ 100 bilhões para ampliar a capacidade de refino do país em 400 mil barris diários. A quantia é uma fábula quando comparada aos US$ 24,7 bilhões investidos entre 1954 e 1999 para refinar uma quantidade de petróleo cinco vezes maior. Chambriard conhece o setor, é “do ramo” e assumirá uma Petrobras em grave crise de reputação. Ou desconsiderará análises técnicas para obedecer ao chefe — e, assim, aprofundará os retrocessos que começaram na gestão Prates —, ou então criará novo conflito com quem tem a última palavra no Palácio do Planalto. Nenhum dos cenários é bom para o Brasil.
Editorial O Globo
Fonte: Blog do Gustavo Negreiros